sexta-feira, 5 de abril de 2013

A história que está por trás...

A história do Coronel Mostarda, o Range Rover.

Tudo começou quando o meu pai em 1994, comprou um Range Rover 200Tdi ,verde escuro de 1993, para ser carro de dia-a-dia para a minha mãe e para ser usado em viagens longas (penso que foi várias vezes a Andorra, não tenho a certeza se chegou a ir aos Alpes Franceses).
Eu tinha cerca de 2 anos de idade quando o Range veio para nossa casa e lembro-me como se fosse ontem, de ser levado ao colégio, numa cadeirinha azul, no banco de trás. Passados uns meses nasceu a minha irmã, e passámos a ser dois a viajar no conforto que um puro Range Rover de duas portas tem para oferecer.
Com cerca de 5 anos entalei os meus dedos na porta do condutor, não sei bem porquê, pode ser só uma falsa memória, mas não me lembro de me ter doido muito. Lembro-me do sobressalto da minha mãe e da cara de pânico que ela fez quando eu apenas disse "ai, o meu dedo".
Com 8 anos lembro-me de ir à Régua com os meus pais e com meu padrinho, que na altura tinha um Land Rover Discovery bordeaux. 
Eu ia com os meus pais e a minha irmã no Range Rover e o meu padrinho ia com os filhos e mulher, no Discovery. Lembro-me como se fosse ontem de ir a viagem toda com os pés em cima da cubby box, que neste momento está muito cansada e debilitada do uso que lhe foi dado , no entanto o Range Rover sempre me pareceu estar presente e nunca deixar ficar mal, talvez fosse por nunca ter enjoado no carro, algo difícil tendo em conta que é um 4x4 imponente. 
Mas as viagens eram sempre suaves e muitas vezes ao som de Pink Floyd na caixa de 6 cds (penso que era phillips ou sonny).
- Lembro-me de passear com os meus pais na costa vicentina com o Range Rover e particularmente do filho do meu padrinho a vomitar para cima da, pobre coitada, cubby box.

Os anos foram passando e com cerca de 10 anos, o Range Rover deixou de ser usado tão frequentemente, altura em que o meu pai comprou um Honda jazz para a minha mãe.
Nunca foi esquecido, todos os fins de semana lá ia-mos nós em viagem, naquele ambiente natural e por razões que não sei explicar, era nitidamente o carro certo para aquela família.

Após 16 anos da sua estreia na família Carvalho, o Range Rover, já com algumas mazelas de combate, não chega a ser vendido a pedido do filho mais velho, que sou eu. 
Não sei se foi pelos vestígios de cocó e chichi la deixados pelas fraldas dos bebés que outrora viajaram naquele enorme banco traseiro, se foi por todas as memórias que são trazidas de volta todas a vezes que ando com ele, mas algo foi, algo que não consigo explicar, algo que me leva a dizer : " este faz parte da família e daqui, já não sai".
- Foi o carro onde andei quando tinha 2 anos, onde a minha irmã recém nascida andou, onde o meu pai, a minha mãe, os meus avós e o meu cão andaram, onde fui a muito lado e vi muita coisa... 
Quando tirei a carta de condução foi com este Range Rover que andei por bons e maus caminhos, é meu amigo, é meu irmão. É meu... É um Almeida Carvalho e isso, nada nem ninguém lhe tira.

Quase 20 anos depois, ainda connosco está e continuará a estar durante muitos mais, com o seu verde metalizado já meio gasto, com alguns toques na pintura e na chapa que o envolve, os estofos já gastos dos 215 mil quilómetros que pouco ou nada pesam neste magnífico automóvel, os plásticos de dentro que de qualidade pouco têm criam os seus barulhos parasitas, as borrachas vedantes já pouco vedam e criam folgas que ainda mais barulho trazem para o condutor... 
No entanto nada disso interessa, porque não há uma única vez em que ande com ele sem esboçar um sorriso de compreensão e alegria como se naquele momento, tudo fizesse sentido e não houvesse mais nada a tratar sem ser acelerar ...com os vidros todos abertos e desfrutar de um dos grandes ícones que a indústria automóvel nos trouxe... Charles Spencer King, onde quer que estejas, em nome de todos nós, em nome das memórias e alegrias que me proporcionaste, em nome de um ícone, em nome de ti, Range Rover, obrigado.

Claro está que "que este miúdo só pode ser doente!" 
Como vêem, não é por acaso que no início referi o meu Range Rover, e agora quero falar-vos de um novo membro da minha família. (Este tipo de carinho por certos carros não se cria, já nasce connosco).
Quando tirei a carta de condução, sempre sonhei ter um dos primeiros puros sangue, um Range Rover suffix A.
E como doente que sou, desde o momento em que formulei esta ideia, que não parei até encontrar um exemplar à venda, por um preço razoável, que eu pudesse reconstruir e quem sabe criar a relação que tenho com o meu amigo Range (como eu lhe trato).
Foram todos os dias durante um ano, a pesquisar intensivamente na internet, em todos os sites e mais alguns... e mesmo quando a esperança já era pouca.... lá estava ele, como se fosse mentira, a reflectir um ar triste, de abandono e de muitos anos a dormir ao relento, sem um ombro amigo com quem falar e já sem esperança de que iria encontrar alguém com coração, com um amor fora do comum por automóveis como ele, com a capacidade de ver de que não se tratava apenas de um "chaço" com um custo de recuperação demasiado elevado..."era aquele" - pensei eu! 
Eram 2h da manhã e quem quiser que confirme que eu nesse dia às 8 da manhã já tinha enviado um e-mail ao anunciante e às 9h30 da manhã estava a ligar para o mesmo! 
Nesse mesmo dia fui vê-lo ao stand e já há muito tempo que não via um automóvel tão bonito, podia estar um bocado camuflado e de difícil percepção, mas para mim, não havia outro como aquele. "Tinha que ser meu".
Nessa noite, tive uma conversa com o meu pai à mesa e garanto-vos que não foi fácil! " Oh pai por 1800 o carro sai dali, por favor eu pago-lhe tudo daqui a uns anos, prometo que pago! Eu só preciso de um empréstimo!" Mostrei as fotografias que tinha tirado e ,penso que isto foi numa segunda feira, quarta já lá estávamos a ver o carro! Oferecemos 1200 euros naquele dia, e o senhor ficou com o nosso contacto. 

Eu sabia que nunca na vida o senhor ia aceitar os 1200 euros, e no dia a seguir (quinta-feira) estava a ligar outra vez ao senhor. " Oiça eu ofereço 1500, fale com o seu patrão e ligue-me as 16h"... claro está que as 17h ainda não me tinha ligado.

Eu estava tão impaciente que fazia piscinas à volta da mesa de jantar!! O meu pai só tinha concordado nos 1500 euros, " o que que eu faço agora?". Foi instintivo, liguei de imediato " Boa tarde, então? Já sabe se o seu patrão aceita os 1500 euros?" Claro que não aceitou, nem eu completamente insano aceitaria! " Oiça eu ofereço 1800 euros mas é mesmo a minha última oferta e digo-lhe que não consigo mesmo ir mais além deste valor, fale com o seu patrão outra vez por favor e ligue-me". 

passou 1h e nada, eram agora 18h e eu ainda não tinha resposta. O que fiz eu? perguntam e bem!
Liguei outra vez! " Estou, então como ficamos? O seu patrão aceita a minha oferta?" senhor: "ah sabe, o patrão diz que 2000 era mesmo o limite e que abaixo desse valor não o pode vender".. eu já quase a chorar : " pronto, eu tenho imensa pena, não lhe posso ficar com o carro e eu queria mesmo ficar com ele, para lhe dar o restauro que merece e duvido que encontre alguém melhor que eu para dono dele, muito obrigado na mesma".. comecei a chorar neste momento. Mas... 20 segundos depois! " Tou, olhe por 1800 euros o carro é seu ,amigo!" Dei à vontade 10 voltas à mesa a correr pela sala de tão contente que estava, o negócio tinha sido fechado e agora era só esperar para tratar da papelada...

Pequeno problema: O meu pai não sabia de nada disto e ainda não sabe, mas pai, estou a escrever isto também para si. 
Liguei ao meu pai, inventei uma grande tanga de como tinha sido o senhor a dizer que por 1800 o carro era nosso, em vez de dizer que tinha sido eu a sugerir...e não é que colou.. " Bem, tens que ligar ao ACP, para combinar irmos lá buscar o carro, a ver se na segunda ou terça-feira o vamos lá buscar, pede que te enviem uma cópia dos documentos" Eu estava tão feliz que me atrapalhei todo..

Pai, isto é dirigido unicamente para ti, eu sei que me tens apoiado em tudo e eu muitas vezes te desiludo. Por favor não penses que é por mal ou por falta de respeito, mas como é que um miúdo pode reagir quando confrontado com um dos seus maiores sonhos? Não é nada fácil fazer um curso de engenharia mecânica e ao mesmo tempo estar a pensar num carro dia e noite. Mas sempre me ensinaste em seguir o que gostava e eu gosto dos dois, tento seguir os dois. 
Não penses que me esforço só no que diz respeito ao carro, porque não é verdade, mas tens que perceber que eu não sou mesmo normal, tenho algo de diferente em mim, um pressentimento, uma chama que não posso apagar porque seria infeliz para o resto dos meus dias, tenho que seguir os carros, porque só assim consigo ser feliz. Pai, eu adoro-te e obrigado por me teres dado metade do teu código genético que faz de mim o que sou agora, um aficionado, um doente, um jovem que vai brilhar neste mundo. Espera que vais ver!

Por último:
Falo directamente para ti, meu amigo amarelo, há muitos anos que não sentia a alegria que senti no dia em que chegaste à entrada de minha casa, e depois de todo o desprezo que sofreste, é o meu dever dar-te o restauro que mereces!
E não vou descansar enquanto não voltares à tua glória antiga, como sendo um dos automóveis mais bonitos alguma vez construídos.
Até lá companheiro.

2 comentários:

  1. João, muitos Parabéns pelo teu trabalho e Blog, certamente o teu Pai é um homem feliz por ler isto! Um Abraço e força nisso.

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    1. Muito obrigado, eu também espero que sim!
      Um abraço

      P.S: Podes identificar-te, se quiseres, nem que seja por e-mail para eu saber com quem estou a falar e a quem devo dirigir a palavra.
      (A não ser que não queiras, o qual entendo perfeitamente).

      Um abraço!

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